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sábado, 8 de abril de 2017

PORCOS ASSADOS

PORCOS ASSADOS





Certa vez irrompeu um incêndio num bosque onde havia alguns porcos, que foram assados pelo fogo. Os homens, que até então comiam carne crua, experimentaram a carne assada. Acharam-na deliciosa. A partir daí, toda vez que queriam comer porco assado, incendiavam um bosque. O tempo passou, e o sistema de assar porcos continuou basicamente o mesmo.

Mas as coisas nem sempre funcionavam bem: às vezes os animais ficavam queimados demais ou parcialmente crus. Os especialistas alegavam que o fracasso do sistema se devia à indisciplina dos porcos, que não permaneciam onde deveriam, à inconstante natureza do fogo, tão difícil de controlar, ou, ainda, às árvores, excessivamente verdes, ou à umidade da terra, ou ao serviço de informações meteorológicas, que não acertava o lugar, o momento e a quantidade das chuvas.

Como se vê, era difícil isolar o problema – na verdade, o sistema para assar porcos era muito complexo. Fora montada uma grande estrutura: havia maquinário diversificado, indivíduos dedicados a acender o fogo – os incendiadores – e especialistas em ventos – os anemotécnicos. Os incendiadores se subdividiam em categorias, conforme o treinamento: incendiadores da zona norte, da zona sul, de inverno e de verão, de fogo diurno e de fogo noturno e assim por diante. Havia um diretor-geral de Assamento e Alimentação Assada, um diretor de Técnicas Ígneas, um administrador-geral de Reflorestamento, uma Comissão de Treinamento Profissional em Porcologia, um Instituto Superior de Cultura e Técnicas Alimentícias e o Bureau Orientador de Reformas Igneooperativas.

Eram milhares de pessoas trabalhando na preparação dos bosques, que logo seriam incendiados. Havia especialistas estrangeiros estudando a importação das melhores árvores e sementes e a produção de chamas mais potentes. Havia grandes instalações para confinar os porcos antes do incêndio, além de mecanismos para deixá-los sair apenas no momento oportuno.

Mas um dia, Joboão, um humilde incendiador do grupamento norte-inverno-diurno, resolveu dizer que o problema tinha fácil solução: bastava, primeiramente, matar o porco escolhido, limpá-lo e cortá-lo adequadamente e colocá-lo então em uma grade de ferro, sobre brasas, até que o efeito do calor – e não as chamas – assasse a carne, sem estorricá-la.

Tendo sido informado sobre as idéias de Joboão, Absalão, o diretor-geral de Assamento e Alimentação Assada, mandou chamá-lo ao seu gabinete:

"Tudo o que o senhor propõe está correto, mas não funcionaria na prática. O que o senhor faria, por exemplo, com os anemotécnicos, caso viéssemos a aplicar a sua teoria? E com os incendiadores de diversas especialidades? E os especialistas em sementes? Em árvores importadas? E os desenhistas de instalações para porcos, com suas máquinas purificadoras de ar? E os conferencistas e estudiosos, que ano após ano têm trabalhado no Programa de Reforma e Melhoramentos? O que eu faria com meu bom amigo (e cunhado), presidente da Comissão para o Estudo do Aproveitamento Integral dos Resíduos das Queimadas? O que eu faria com todos eles, se a sua sugestão fosse aceita?"

"Não sei", disse Joboão, encabulado.

"O senhor percebe agora que a sua ideia não atende às nossas conveniências? O senhor não vê que, se tudo fosse tão simples, nossos especialistas já teriam encontrado a solução há muito tempo? O senhor, com certeza, compreende que eu não posso simplesmente convocar os anemotécnicos e dizer-lhes que tudo se resume a assar um porco por vez, sobre brasas, sem chamas. O que o senhor espera que eu faça com os quilômetros de bosques já preparados, cujas árvores não dão frutos e sequer têm folhas para dar sombra? E o que fazer com nossos engenheiros em porcopirotecnia? Vamos, diga-me!"

"Não sei, senhor."

"Bem, agora que o senhor conhece as dimensões do problema, não saia por aí dizendo que pode resolver tudo. O problema é bem mais sério do que o senhor imagina. Aqui entre nós, devo recomendar-lhe que não insista nessa sua ideia – isso poderia trazer problemas para o senhor no seu cargo."

Joboão, coitado, não deu mais um pio. Sem despedir-se, meio atordoado, meio assustado, botou o rabo entre as pernas, saiu de fininho e nunca mais se ouviu falar dele.

Adaptação do texto Fábula de los cerdos asados o la reforma de la educación, no livro Juicio a la escuela, Buenos Aires: Humanitas, 1976

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